Quem viu o filme Bambi, a quinta longa metragem de animação de Walt Disney, estreada em plena Segunda Guerra Mundial (1942 – a Portugal só chegou no dia 17 de janeiro de 1944) e se emocionou até às lágrimas?
Talvez até tenham aí por casa um ou dois álbuns ilustrados, em versões adaptadas, ou com as imagens coloridas da pequena corça e dos seus amigos?
Mas quantos leram as quase duzentas páginas do livro original, para adultos, Bambi – Uma Vida nos Bosques, escrito pelo jornalista, crítico e escritor austríaco Felix Salten?

Bambi: Eine Lebensgeschichte aus dem Walde by Salten, Felix
Publicado há precisamente um século, em 1923, Bambi é muito mais do que um dos livros banidos por Hitler, uma fábula versando o antissemitismo dos Anos 20. É uma profunda parábola sobre a condição humana – a necessidade de sobreviver, de resistir à dor e à perda, de vencer o medo; a capacidade de aceitar a arbitrariedade dos acontecimentos, respeitar a natureza e lidar com a mais dura solidão, com os perigos omnipresentes, mais próximos ou distantes, com as ameaças inesperadas e traições vindas da própria espécie; a urgência de assumir o controlo do seu destino…
Bambi é tudo isto, decerto, mas é também uma das mais universais e inolvidáveis lições de amor da história da literatura:
“- Não julgues que é coisa fácil ir ao prado – continuou ela; – é perigoso e difícil. Não me perguntes porquê, sabê-lo-ás mais tarde. Por agora, obedece exactamente ao que te digo; prometes?
O pequeno prometeu.
-Bem; eu vou sair primeiro sozinha; ficas aí e esperas, sem tirares a vista de mim. Se me vires regressar, dá meia-volta e corre com toda a velocidade de que fores capaz; depois apanho-te.
Calou-se, pareceu reflectir e insistiu de novo:
-De qualquer maneira, corre o mais que possas, corre mesmo no caso de acontecer qualquer coisa, mesmo se vires que… que eu caí no chão; não te importes comigo, compreendes? Seja o que vires ou ouvires, foges imediatamente, o mais depressa possível; prometes-me?
-Sim – disse Bambi, baixinho.”
(Versão portuguesa Edição E-primatur, 2016: 18)
Paula Pina

Bambi
Sem comentários